ANÁLISE POLÍTICA
Voto retrospectivo e voto da ambição em 2010
Brasília, 12 de novembro de 2009 - nº 128
Depois de tanto criticar o governo Cardoso pelo apagão de 2001, o presidente Lula viu o noticiário da semana tomado por fotografias estranhamente familiares: as grandes cidades do Sudeste brasileiro mergulhadas na escuridão.
O apagão teria sido causado por eventos climáticos, mas a oposição não perdeu tempo e pôs em circulação suspeitas de falta de investimentos na segurança do sistema. Subitamente, pareceu que o governo Lula estava sendo punido pela negligência com que tratou temas importantes, como a elevação da taxa de investimentos. A própria ministra Dilma Rousseff (PT-RS) poucos dias antes afirmara que o tempo dos apagões tinha acabado.
Independentemente de suas causas ou implicações de médio prazo, o apagão cria interesse em duas questões importantes sobre o contexto da eleição de 2010: (a) o governo Lula corre o risco de ser vitimado eleitoralmente por temas da agenda de reformas que abandonou? (b) a retórica de campanha de sua candidata presidencial está mesmo ajustada ao momento econômico gerado por seu governo?
1. Estado, reformas e câmbio
Um exame da configuração do noticiário político já mostraria o governo Lula envolvido com problemas criados pelo seu próprio desinteresse em questões relativas à gerência do Estado.
Tendo feito a opção por um programa de várias obras de menor escala pelo país – o PAC -, o governo vive hoje os efeitos colaterais da difusão de problemas e polêmicas por todos os estados. Praticamente toda a semana alguma irregularidade é noticiada, enquanto o governo é forçado a reconhecer as dificuldades de sua execução orçamentária.
Forçado a entregar a gestão de boa parte dos projetos do PAC a lideranças aliadas, não restou ao governo senão abrir um conflito com o Tribunal de Contas da União por conta da fiscalização das obras. A proposta de afrontar a posição institucional do TCU, criando outras instâncias de controle ou livrando funcionários de suas punições, soa negativa em termos eleitorais.
A questão das obras paradas no TCU nem se compara à possibilidade sugerida pelo apagão da última terça-feira. Conjugado à retomada do crescimento econômico, ele trouxe de novo a sombra do “gargalo”, que mistura a imagem de incompetência gerencial com a impressão de falta de investimentos.
Uma sombra que poderia ser ampliada com o agravamento da questão cambial e com uma percepção mais clara de que apenas a melhora da competitividade da economia é uma resposta consistente para a valorização do real.
Por enquanto, são apenas sombras no horizonte, mas elas abrem, para a oposição, a possibilidade de analisar de outra maneira o sucesso do governo Lula. Um sucesso que estaria criando problemas para os quais ele não tem uma solução.
Eleições, não custa insistir, são ganhas com imagens: podem ser imagens de ruas escuras ou de caminhões carregados sem porto para escoar, ou de estradas sem conservação, de obras paradas por irregularidades, etc.
2. Dilma e políticas sociais
A transformação econômica dos últimos anos, da mesma forma como pode terminar realçando a falta de investimentos em áreas cruciais, pode alterar a importância relativa das chamadas políticas sociais. Na ausência de qualquer ameaça crível de redução dos programas de transferência de renda, parte do eleitorado pode ser perguntar: e o que vem agora?
Basta mencionar apenas um fato emergente da última PNAD: uma demanda estimada de mais de 40 milhões de pessoas por cursos profissionalizantes, educação com impacto direto sobre a renda dos indivíduos. Que candidatura poderá melhor atender a essa demanda?
A ascensão social da chamada classe C não tem como ser neutra em termos eleitorais. Ela pode olhar para o passado e premiar quem lhe abriu o caminho ou avaliar quem será o candidato mais capaz de atender suas demandas em relação ao futuro. O problema eleitoral de resolver a questão da pobreza é que diminui o número de eleitores pobres e mais dependentes.
3. Voto retrospectivo e voto da ambição
A maioria dos modelos de previsão de resultados eleitorais baseia-se no voto retrospectivo: governos bem sucedidos economicamente são premiados com a reeleição. A eficácia preditiva, contudo, depende muito de uma restrição de escolhas, uma definição clara de quem é governo e de quem é oposição em termos partidários e ideológicos.
Na ausência de identidades partidárias sólidas e de diferenças ideológicas entre os candidatos, o cardápio de alternativas é maior. A oposição brasileira não está necessariamente condenada pelo voto retrospectivo em 2010. Será possível votar não apenas para premiar ou punir o passado, mas para atender sua ambição quanto ao futuro. Uma escolha que pode ser, com habilidade, sugerida por campanhas eleitorais bem desenhadas.
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Brasília, DF
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
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