segunda-feira, 23 de novembro de 2009

174) Eleicoes petistas: impacto sobre o quadro eleitoral de 2010

PT escolhe direção e congresso que definirá programa de governo
Cristiane Agostine, Maria Inês Nassif, Paola de Moura e Sérgio Bueno, de Brasília, São Paulo, Rio e Porto Alegre
Valor Econômico, 23/11/2009

No dia em que o PT fechou as urnas do seu Processo Eleitoral Direto (PED) como uma coroação do protagonismo que deverá retomar no processo eleitoral de 2010 e num governo de Dilma Rousseff, se a candidata vencer as eleições, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva votou de camisa vermelha e deixou registrado o seu desagrado ao ao comportamento dos diretórios regionais do partido que não cederam nas negociações de aliança eleitoral com o PMDB. "Eu não tenho mais ilusão quando se trata de disputas locais. Por mais que a gente oriente as pessoas de que o que deve prevalecer é o projeto nacional, normalmente o que tem acontecido é que cada um olha para o seu umbigo e prevalecem as questões dos Estados", disse. "O que é importante é que se houver divergências dentro da base aliada nos Estados, que isso não seja impeditivo para a ministra Dilma ter dois ou mais candidatos apoiando sua candidatura", relativizou.

Lula referiu-se aos casos de Estados como Minas, Rio e Bahia, que mantém decisão de candidatura própria apesar de isso poder resultar no fracasso da negociação nacional com o PMDB. O presidente votou ontem pela manhã, na sede nacional do PT, em Brasília, acompanhado de sua esposa, Marisa Letícia, e da ministra Dilma.

Em Minas, o PED tornou mais remotas as chances de o partido abrir mão de uma candidatura própria (ver matéria). No Rio, a eleição está polarizada entre os grupos do PT que querem a aliança com o PMDB já no primeiro turno da eleição de 2010 e os que pleiteiam uma candidatura própria a governo do Estado. A pré-candidatura ao governo que está na mesa é a do prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Farias, que interpretou as declarações de Lula como reconhecimento de que partido não vai conseguir unificar todos os Estados.

Ao lado do presidente Lula na votação, a ministra e pré-candidata Dilma disse que o PT não pode "ser fundamentalista" na articulação de alianças com outros partidos nos Estados. A ministra, no entanto, afirmou que o que for decidido pelo Congresso do PT, em fevereiro, sobre as alianças deverá ser seguido nos Estados.

Embora pareça uma contradição, terminado o PED o PT deverá se envolver na construção do "protagonismo" reclamado por todos os candidatos a presidente durante a campanha que terminou ontem, com a provável vitória em primeiro turno do ex-senador e ex-presidente da Petrobras José Eduardo Dutra, candidato da tendência Construindo um Novo Brasil (CNB), que teve o apoio do grupo Novo Rumo, que tem na ex-prefeita Marta Suplicy uma de suas expoentes, e do PT de Lutas e de Massas, facção ligada à família Tatto que chegou ao segundo turno PED de 2009, na disputa pela presidência do PT. O resultado oficial deve ser proclamado na terça-feira.

Além de definir o presidente do partido e a composição do Diretório Nacional - que deverá escolher a Executiva - pelos próximos três anos, os filiados que compareceram ao PED escolheram também os delegados do congresso nacional que será realizado em fevereiro. Instância máxima do PT, tem o poder de definir as diretrizes partidárias, as políticas de alianças e normas de condução interna.

Com número de delegados proporcional à votação do PED, cada uma das oito chapas ao Diretório Nacional (que concorreram simultaneamente aos seis candidatos a presidente da sigla) terá condições de participar do congresso, que deve ter cerca de 1.300 delegados - um para cada mil filiados. "Por menor que os grupos sejam, eles têm sempre voz; se não disputarem, somem da dinâmica partidária", afirmou o deputado José Genoíno, ex-presidente da legenda.

Durante o processo eleitoral, questões programáticas e de alianças foram intensamente debatidas e todos as candidaturas, mesmo as mais ligadas ao presidente Lula, concordam que num terceiro governo do PT, sem Lula, o partido terá de ter um protagonismo maior nas definições programáticas e nas decisões de governo. "O partido não tem que conceber políticas públicas apenas quando está na oposição", afirmou o deputado federal José Eduardo Martins Cardozo (SP), candidato a presidente pela Mensagem ao Partido, que deve sair como a segunda força do PT dessas eleições, mesmo sendo uma tendência relativamente nova - foi criada após o escândalo do mensalão, em 2005. "A confusão entre partido e governo permeou a ação partidária, muitas vezes com os presidentes do partido agindo como porta-vozes do governo, e não do partido", disse.

Eleitor de Cardozo, o ministro Tarso Genro defendeu, num eventual governo de Dilma Rousseff, um partido "mais organizado, mais vinculado aos movimentos sociais e mais integrado às grandes decisões políticas do governo." Com a ressalva de que o atual presidente, deputado Ricardo Berzoini (SP), "desempenhou seu papel num momento difícil da vida do partido", durante a chamada crise do Mensalão, a ex-prefeita Marta Suplicy, que apoiou a chapa de Dutra, disse que ele foi a "reboque" de Lula e de Dilma e o PT tende a retomar o controle nessas eleições.

Também há uma convergência nas questões programáticas e nas opiniões sobre políticas de alianças - embora os candidatos à esquerda, como Markus Sokol, da Tendência "Terra, Trabalho e Soberania" e Serge Goulart, da "Virar à Esquerda, Reatar com o Socialismo", sejam contrários à aliança com o PMDB. As demais tendências, agrupadas em torno dos candidatos José Eduardo Dutra, Geraldo Magela, Iriny Lopes e Cardozo defenderam o fortalecimento do núcleo de esquerda na aliança eleitoral e numa eventual coalizão sem, no entanto, descartar uma aliança eleitoral com o PMDB. Essa confluência resulta também num entendimento generalizado de que programaticamente o PT pode caminhar para compromissos mais progressistas com Dilma do que nos dois governos de Lula. "Existem tarefas que agora podem ser realizadas; antes não podiam", afirmou o ex-deputado e ex-presidente do partido José Dirceu. Ele aponta como temas o aprofundamento da distribuição de renda e reformas política, educacional, tecnológica e de gestão pública, além de questões ambientais no agronegócio e na agricultura familiar. "A sociedade espera um maior papel do Estado e não sei se isso é guinar à esquerda, porque não sei se o empresariado vai ser contra."

Integrantes de tendências mais à esquerda do partido, no entanto, estão pessimistas quanto a possibilidade de o PT dar uma guinada à esquerda. Sokol disse que houve uma recomposição do antigo Campo Majoritário, que tinha ampla maioria no partido até o escândalo do mensalão. O dirigente e candidato defende o debate da atualização do índice de produtividade da terra e o aumento do controle estatal sobre as reservas de petróleo.

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