sexta-feira, 2 de julho de 2010

Dilemas da oposicao: fazer o governo perder

Missão quase impossível
Editorial O Estado de S.Paulo
02 de julho de 2010

Com a escolha do deputado federal Antonio Pedro Índio da Costa (DEM-RJ) para compor, como candidato a vice-presidente da República, a chapa oposicionista encabeçada pelo ex-governador José Serra, completa-se, finalmente, o quadro sucessório e a campanha eleitoral entra em sua fase crucial, que culminará com a escolha, pelo eleitorado, dos que governarão o País nos próximos quatro anos. É de se registrar que a chapa do PSDB se constituiu, na undécima hora, como solução de uma crise que quase levou à ruptura da aliança com o Democratas, que se sentira excluído e humilhado com o anúncio da formação de uma chapa "puro-sangue" tucana, tendo como vice o senador paranaense Álvaro Dias.

O recuo dos tucanos apaziguou seus aliados e acrescentou à chapa oposicionista um político jovem, ligado ao mais recente e prestigiado movimento da sociedade civil ? aquele que resultou no Projeto Ficha Limpa.

Permanece, no entanto, a grande dificuldade que enfrenta a candidatura José Serra, para tentar superar a candidatura Dilma Rousseff, em razão do que é sabido: não é com ela que Serra disputa, mas sim com Lula, que concorre por interposta pessoa ao terceiro mandato.

Tanto assim que o presidente deixou de usar suas habituais metáforas e alegorias para dizer, sem subterfúgios e pudor, que o nome "Lula" deverá ser lido pelos eleitores, na urna eletrônica, no lugar em que estiver escrito o nome "Dilma". Não poderia deixar mais clara a sua intenção. E aí está, justamente, o aspecto inusitado da atual campanha sucessória presidencial: a oposição enfrenta um candidato fortíssimo que não é candidato.

Nunca, na história deste país, houve eleições com estas características, por mais que na política contemporânea tenham surgido criaturas "inventadas" por líderes populares para sua sucessão. Tampouco abundam exemplos de transferência de votos, como as pesquisas indicam que acontecerá no pleito de outubro.

Quando o ex-governador José Serra se tornou candidato à sucessão presidencial, uma questão fundamental se colocou: qual seria o discurso da oposição? Que mensagem o candidato deveria transmitir ao eleitorado? Ninguém discutiu ? como foi o caso de Dilma ? o seu preparo para o cargo, reconhecido pelos próprios adversários, nem a sua experiência na gestão da coisa pública. Mas faltava a definição de um discurso que caracterizasse as alternativas da oposição a um governo chefiado por um presidente de popularidade imbatível.

A ideia contida no bordão "o Brasil pode mais" até que, num primeiro momento, pareceu um caminho interessante para o discurso oposicionista, já que não confrontava o presidente. Mas isso e o reconhecimento das qualidades da gestão lulista, que completava o quadro, não eram suficientes para conquistar a massa eleitoral que apoia o carismático presidente.

Como não poderia deixar de ser, todo o esforço da candidatura oposicionista consiste em fazer a confrontação entre pessoas reais ? Dilma Rousseff e José Serra ? comparando biografias e experiências na vida pública, na tentativa de mostrar que Lula, o mito, não está à disposição do eleitorado para ser eleito pela terceira vez. As pesquisas eleitorais indicam que esse esforço da candidatura oposicionista ainda não tem sido bem-sucedido e a campanha sucessória presidencial segue, exatamente, o rumo plebiscitário traçado pelo presidente Lula.

Em sua recente viagem aos Estados atingidos pela tragédia das enchentes, no Nordeste, uma população castigada e que não foi contemplada pelo governo federal com investimentos e obras contra calamidades aclamou Lula com devoção assemelhada à dedicada a figuras como Padre Cícero ou Antonio Conselheiro. Na verdade, a popularidade de Lula não se deve só ao seu carisma e à sua habilidade para se comunicar com o povo. Deve-se, basicamente, ao fato de que ? não principalmente por mérito do seu governo ?, nestes últimos oito anos, todos os setores da sociedade brasileira foram beneficiados por um desenvolvimento econômico global, só interrompido no fim de 2008 por essa crise que pouco afetou os países em desenvolvimento.

Por isso a missão quase impossível do candidato Serra é provar que não é verdade que oposição não ganha eleição; governo é que perde eleição. 

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