quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

277) Grave precedente no plano constitucional

A matéria abaixo confirma que o Estado -- no caso o governo -- é o principal violador da legalidade constitucional. PRA.

Dano irreversível
Regina Alvarez
O Globo, 10/02/2010

O governo esteve empenhado nos últimos dias em mobilizar sua tropa de choque no Congresso para cristalizar decisão do presidente Lula que liberou quatro obras da Petrobras com suspeitas de irregularidades graves, a despeito das recomendações do TCU e da Comissão Mista de Orçamento.

Ontem, o veto presidencial foi colocado em votação à noite e a vitória governista era considerada favas contadas pela própria oposição.

Assim, confirmada essa “vitória” anunciada, as quatro obras com indícios de sobrepreço, pagamentos indevidos a empresas e outras irregularidades graves, seguem recebendo recursos do Orçamento. Para defender o desbloqueio, o governo usou como argumento os prejuízos da paralisação. Falou em perda de 25 mil empregos e estimou o prejuízo em R$ 268 milhões mensais. Levada ao pé da letra, essa alegação impediria a paralisação de qualquer outra obra com indícios de irregularidades, já que a suspensão sempre traz prejuízos e perda potencial de empregos. No caso das obras públicas, é um mal menor para evitar o pior, que é o desvio de recursos e a vitória da corrupção.

Em apenas uma das obras bloqueadas, a Refinaria Abreu e Lima, em Recife, o TCU identificou sobrepreço de R$ 121 milhões, e notem que, neste caso, só foram analisados 12% das planilhas de custo. A Petrobras boicota o trabalho dos auditores do Tribunal e impede o acesso às informações. Lança mão de expedientes pequenos para dificultar esse trabalho, como, por exemplo, dizer que não pode encaminhar as planilhas em Excel, por falta de condições técnicas.

A própria Consultoria de Orçamento ressaltou recentemente, em nota, que os argumentos do veto são frágeis e não se baseiam no comando constitucional que regula o assunto. Os prejuízos potenciais decorrentes da paralisação dessas obras estavam colocados há meses nas discussões da Comissão Mista e a Petrobras não mexeu um dedo para esclarecer e resolver as pendências, como fizeram outros órgãos que conseguiram tirar seus empreendimentos da “lista negra”. A estatal preferiu montar um jogo de cena e propôs, de última hora, um grupo de trabalho para discutir as irregularidades — ideia rejeitada pelo TCU — preparando terreno para o veto presidencial.

Em parecer que analisa o veto, consultores da Comissão de Orçamento alertam que prosseguir com obras suspeitas de irregularidades graves pode consolidar danos iguais ou maiores àqueles que o governo diz querer evitar.

O sinal verde do governo para que essas obras continuem a receber recursos públicos, sem a garantia de que as irregularidades serão sanadas, enfraquece e desqualifica o trabalho do TCU e abre uma porteira para que outros casos parecidos tenham igual tratamento. Reforça a percepção de que a Petrobras é diferente e não se submete ao controle externo, ao contrário do que diz a lei.

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