Mais 31 legendas nos ameaçam
Editorial O Estado de S.Paulo, Sábado, 02 de Janeiro de 2010
Com a chegada de mais um ano eleitoral, cientistas políticos e juristas especializados em legislação eleitoral constataram que, além das 27 agremiações já existentes no espectro partidário, outras 31 legendas estão funcionando em caráter provisório. E, como seus dirigentes não têm medido esforços para tentar obter o registro definitivo, isso pode levar o Brasil a contar com 58 partidos políticos, o que é um absurdo.
Os nomes desses partidos provisórios já dizem tudo. À esquerda, destacam-se a Liga Bolchevique Internacionalista e o Partido Comunista Revolucionário. À direita, destaca-se o Movimento Integralista Brasileiro. E, no meio dessa gelatina ideológica, há uma agremiação que apresenta um ideário alternativo sob o sugestivo nome de Partido Pirata. Evidentemente, todas essas legendas carecem de representatividade e, muito mais, de legitimidade. Apesar de a Constituição de 88 consagrar o sistema pluripartidário, é evidente que a maioria ? se não a totalidade ? dessas legendas não foi criada com propósitos sérios.
Algumas legendas pretendem atuar como simples "línguas de aluguel" ? aquelas que, em troca de cargos ou de dinheiro, fazem o serviço sujo, atacando a honra de candidatos competitivos dos grandes partidos a cargos majoritários. Infelizmente, essa prática não é nova. Há vinte anos, por exemplo, na primeira eleição direta para a Presidência da República, esse papel foi exercido por "Marronzinho", um desconhecido que se candidatou por um partido nanico e passou a campanha difamando os candidatos que se destacaram nas primeiras pesquisas de opinião pública, como Mário Covas e Leonel Brizola. Outras agremiações foram criadas para vender vagas a candidatos que não conseguiram legenda nos principais partidos.
Mas os dirigentes das 31 legendas que funcionam em caráter provisório, aguardando a aprovação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), têm ainda outros objetivos. O primeiro deles é abocanhar uma fatia dos R$ 149 milhões do Fundo Partidário, que são repassados anualmente às agremiações com registro definitivo. O segundo objetivo é dispor de cerca de cinco minutos de TV e de rádio por semestre para apresentar suas propostas, que variam de delirantes exercícios retóricos a promessas de obras absurdas, como a criação de linhas de "aerotrem" e a criação de novas unidades federativas a partir da divisão dos Estados já existentes.
Além de reforçar o fisiologismo, dando margem a todo tipo de negociações espúrias, a proliferação de legendas sem qualquer representatividade confunde o eleitorado, distorce o debate ideológico e desmoraliza o jogo político, comprometendo a própria vitalidade do regime democrático. Nos países com consolidada democracia representativa, há três ou quatro partidos no máximo. No Brasil, para se criar um partido basta, inicialmente, reunir 101 pessoas, que integrarão os diretórios distritais, municipais e estaduais. Mas em seguida, para demonstrar seu "caráter nacional", as legendas precisam obter cerca de 468 mil assinaturas de "apoiadores" espalhados por nove Estados, no mínimo. Até recentemente, como isso é caro, por envolver gastos com viagem e pagamento de coletores de assinaturas, várias legendas vinham optando por se juntar para conseguir o número mínimo de "apoiadores".
Nos últimos anos, porém, com a expansão de "igrejas" evangélicas e o propósito de algumas centrais sindicais de se converterem em partidos políticos, a falta de dinheiro deixou de ser problema. Trata-se de um "investimento" que pode ser facilmente amortizado desde que a agremiação emergente se coligue a alguma "base governista" ou, em troca de apoio ao Executivo, possa indicar diretores de bancos oficiais, chefes de departamentos financeiros de empresas estatais e conselheiros de fundos de pensão e de organismos financeiros constituídos nos moldes do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Em pouco tempo o capital investido retorna.
A proliferação de agremiações nanicas e de legendas de aluguel só não tem causado mais danos à democracia brasileira porque o TSE tem sido rigoroso na concessão de registro definitivo. O mais sensato, contudo, seria aprovar leis mais drásticas, que limitassem a criação de partidos e assegurassem uma efetiva representatividade ao jogo político.
domingo, 3 de janeiro de 2010
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