terça-feira, 26 de janeiro de 2010

242) O TSE e a campanha eleitoral antecipada

A salvo da lei
Ricardo Noblat
O Globo, 25/01/2010

"O presidente Lula é hoje uma das maiores lideranças mundiais, para não dizer a maior.
E vamos fazer mais". (Dilma)

No último sábado, no interior de São Paulo, durante cerimônia pública de autorização de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), os olhinhos da ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, brilharam quando Michel Temer (PMDB), presidente da Câmara dos Deputados, disse que ela está habilitada a "levar os brasileiros para o paraíso".

Dilma comentou na hora: "Acho que qualquer pessoa, principalmente alguém que integra o governo Lula, pode ser escolhido. Mas concordo em gênero e número com o deputado Michel Temer, e gostaria muito de levar os brasileiros ao paraíso.

Acho uma das maiores e melhores ambições que alguém pode ter".

Se lhe parece que Dilma se referiu à sua própria candidatura, então saiba que ela transgrediu a lei. No exercício de cargo público, durante cerimônia custeada com dinheiro público, Dilma fez propaganda indireta de sua ambição. A lei estabelece o dia 5 de julho como o do início oficial da propaganda eleitoral. Sinto muito, gente, é a lei.

Pois o que vale para Deda Amorim deveria valer para Dilma e todo mundo. Exprefeito de Rodrigues Alves, no Acre, Deda foi condenado na semana passada pelo Tribunal Regional Eleitoral a pagar multa de R$ 5 mil por ter feito propaganda antes da hora. Deda valeuse do seu twitter para dizer que será candidato a deputado. Apenas isso.

Também na semana passada, o Tribunal Regional Eleitoral da Bahia condenou o ministro Geddel Vieira Lima, da Integração Nacional, e o PMDB a pagarem uma multa de R$ 25 mil pelo mesmo crime cometido por Deda. Um jornal do partido defendera a candidatura de Geddel ao governo da Bahia.

Foi o que bastou.

Pelo rigor, tornou-se célebre uma decisão tomada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em junho de 2005. Por quatro votos contra três, o TSE cassou os mandatos de Idomar Antônio Aquilla e Paulo Cláudio Dolovitsch, respectivamente prefeito e vice-prefeito do município gaúcho de Ajuricaba, reeleitos um ano antes. Por quê?

Ora... Um funcionário da prefeitura, representando os dois, compareceu a reuniões para o sorteio do horário de propaganda eleitoral no rárádio.

O mesmo funcionário foi flagrado depois checando o resultado da apuração dos votos. E ficou comprovado o uso do fax da prefeitura para o repasse a um juiz de números de uma pesquisa de intenção de voto.

Um dia antes de Dilma admitir que "gostaria muito de levar os brasileiros ao paraíso", Lula inaugurou a nova sede do Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados de São Paulo.

E ali, ao lado de Dilma, fez o que mais tem feito com indisfarçável prazer desde o início do ano passado — agrediu a lei eleitoral.

"Eu penso que a cara do Brasil vai mudar muito e quem vier depois de mim, eu por questões legais não posso dizer quem é, espero que vocês adivinhem, vai encontrar um programa pronto, com dinheiro no Orçamento", afirmou Lula. Que não satisfeito em desprezar a lei, agora debocha, escarnece dela. E por tabela, dos que deveriam aplicá-la.

Em maio do ano passado, em visita ao Complexo do Alemão, Lula ouviu a platéia ensaiada gritar o nome de Dilma para presidente. Respondeu com o cinismo habitual: "O Lula não falou em campanha.

Vocês é que se meteram a cantar, a gritar o nome aí...

Espero que a profecia que diz que a voz do povo é a voz de Deus esteja correta".

Há pouco, em visita a Minas Gerais, Lula repetiu o mesmo truque: "Vocês ficam gritando o nome da Dilma. Se a Justiça achar que isto aqui é propaganda, cada um de vocês vai ser responsável por colocar um advogado para defendê-la, porque ela só pode falar em política depois do dia 3 de abril quando deixar o governo".

A Justiça Eleitoral engole tudo calada porque lhe falta coragem para enquadrar um presidente com 80% de aprovação popular. De resto, há ministros que não disfarçam sua torcida pela eleição de Dilma. Um deles deve sua indicação para o cargo não a Lula — mas a dona Marisa.

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